Naquela
tarde de fim de primavera, a sala de aula mostrou-se diferente a Maria. As palavras
que a professora pronunciara tinham entrado de rompante no seu entendimento, e
tudo por causa da estranha pergunta que a professora havia lançado aos alunos.
- Meninos,
algum de vocês conhece o sítio onde moram as cores do arco-íris?
A
pergunta tão especial, e inesperada, ninguém respondeu. O silêncio tomou conta
da sala e todos os lábios se aquietaram receosos. Apenas o olhar azul de Maria se
remexeu na sua curiosidade. Na verdade, só a bela menina de oito anos, quase
sempre irrequieta na sua forma de ser, mostrou o interesse necessário de
descobrir tão mágico lugar.
Terminada
a escola, Maria regressou a casa, entrou no quarto, arrumou a pasta vermelha ao
seu canto costumeiro e fitou a luz cintilante que entrava pela janela. O seu
olhar continuava inquieto e à procura de uma só resposta. A pergunta que a
professora havia feito continuava a percorrer-lhe o pensamento: «Meninos, algum
de vocês conhece o sítio onde moram as cores do arco-íris?»
Sem mais, a pequena Maria espreitou a ver se
não havia ninguém e saiu de casa. No céu, duas pequenas aves voavam apressadas
e o sol continuava bem amarelo. Ainda não eram seis horas da tarde.
Ora correndo, ora caminhando apressada, Maria
nem sequer olhava para trás. Para a frente era o seu destino. Os campos
pintados de verde estendiam-se em seu redor, confortados pela brisa amena que
se soltava de leste. A dada altura, e porque o cansaço também faz parte de qualquer
demanda, ela sentou-se numa pedra que para ali estava, encostou o rosto ao
silêncio do momento e quando já adormecia, uma voz calma e doce trouxe-a de
volta.
- O que
estás aqui a fazer? – perguntou um velho que, sem se saber como e de onde, ali
apareceu.
Um
pouco assustada, Maria ergueu-se, fitou o homem e teve medo! Como o rosto do
seu interlocutor lhe manifestasse alguma confiança, aquietou o coração e sempre
conseguiu dizer:
- Eu…eu
ando à procura do sítio onde moram as cores do arco-íris.
Como
que já estivesse à espera de tal resposta, o velho colocou um sorriso nos
lábios e, com um gesto simpático, apontou-lhe a direção do norte. Entretanto,
com uma disposição de perfeita simpatia, tirou de um bolso, do seu gasto casaco,
um pequeno mapa, que colocou nas mãos de Maria, e onde se desenhava uma meta
assinalada. Depois, sem mais, desapareceu no alaranjado do crepúsculo
vespertino que naquela altura se iniciava. Maria levantou-se, agradeceu e
seguiu os desígnios que o velho lhe apontara.
Se por
entre vales e outeiros, Maria tentava encontrar o sítio onde moram as cores do
arco-íris, em casa, seus pais viviam momentos aflitivos. Sem saberem notícias
de sua filha, procuravam-na pelos lugares mais óbvios, mas nada. E foi no meio
deste alvoroço todo, que um grupo de colegas de Maria decidiu também
procurá-la.
Dispostos
a encontrar a Maria, o grupo de amigos meteu os pés ao caminho e seguiram a
direção do norte. Num dos prados por onde passaram, a cor violeta de umas
flores silvestres, acomodadas em redor de um penedo antigo, ainda despertaram a
sua curiosidade, mas o seu objetivo era outro e continuaram em frente. Com a
noite a romper no horizonte, muitas preocupações começaram a surgir, o que levava
a que nenhuma das crianças reparasse que as estrelas já começavam a despertar
no céu.
Onde
estaria Maria? Por onde andaria a sua colega de escola?
Com a
escuridão a cobrir o horizonte e o caminho a seguir, uma gruta na encosta
serviu para eles se abrigarem e passarem a noite. Como as circunstâncias não
permitiram que o sono habitual chegasse a horas decentes, o contar de algumas
histórias e o recordar dos passos que a sua amiga tinha dado nos dois últimos
dias, antes do seu desaparecimento, ajudaram a passar o tempo. Só pela
madrugada, os olhos se cerraram até ao momento exato em que um estrondo forte
os acordou.
Uma invulgar
trovoada de maio espraiava-se pela manhã, sem ter de esperar pela tarde, como é
habitual acontecer. Se raios e trovões afligiam os espaços, uma chuva
persistente obrigou os seis amigos a continuarem no seu local de abrigo. Só por
volta da dez da manhã, é que tudo acalmou, e permitiu que se preparassem para
continuar a procurar Maria. Mas não foi necessário fazê-lo, porque o destino se
encarregou de tudo.
Quando
abandonavam a gruta, e para surpresa das partes, deram de caras com Maria que,
tal como eles, se abrigara ali perto, numa outra gruta, escavada mais abaixo.
Afinal, eles passaram a noite quase juntos, apenas separados por poucos metros,
naquele lugar, situado a norte da vila onde residiam.
E
porque tinha de ser assim, muitas perguntas surgiram, para uma só resposta.
-
Maria, por que fizeste isto?
- Por
que não nos dissestes nada?
- Já
imaginaste a confusão que arranjaste?
- Não
tiveste medo?
Num tom
de quem ainda não encontrara o que procurava, Maria fixou-os com o olhar e, sem
mais, adiantou:
-
Calma. Eu estou bem. Eu apenas vim à procura do sítio onde moram as cores do
arco-íris. Qual é o problema?
- Qual
é o problema? O problema é que andámos para aqui à tua procura, e agora os
nossos pais também devem estar aflitos, - acrescentou um dos colegas.
Como
quisessem continuar a discussão, um grito agudo, fez com que todos olhassem o
céu já liberto da chuva matinal e agora pintado de beleza.
-
Olhem. Lá no alto. Que bonito! É o arco-íris. Tão grande!
Satisfeita, Maria pregou os olhos no céu, e por lá os
deixou ficar por muito tempo. Depois, com um sorriso enorme, disse bem alto:
- Encontrei-o. Este é o sítio onde moram as cores do
arco-íris…
“Nunca encontrarás o arco-íris
se estiveres sempre a olhar para baixo.”
Carlos
Afonso